A morte do arquiteto: Parametrização e fabricação digitaL

Como a parametrização e a fabricação digital podem mudar o processo de produção e vivência do espaço?

O meio digital não é a binarização do papel. A parametrização e a fabricação digital devem mudar a relação do arquiteto com o espaço, e não apenas serem seu instrumento – não devem apenas facilitar o processo de produção e vivência do espaço, mas subvertê-lo. Com a parametrização, o espaço ganha abertura, na medida que o arquiteto cede o controle a processos cujo seu domínio é restrito. Cedendo o controle do projeto, ele cede o significado e a interpretação do espaço às demandas de quem o habita. Em certo sentido, todo espaço é aberto pois sua interpretação nunca é unívoca. Contudo, tratamos de uma abertura específica – aquela que, através de meios digitais, retira do autor suas determinações sobre a obra, entregando ao usuário o significado e a interpretação do espaço. Procedimento semelhante operou a música contemporânea que gradualmente cedeu ao intérprete uma notação semelhante aos “jogos de armar”, criou possibilidades combinatórias, zonas de indeterminação, campos probabilísticos: é o caso das obras de Boulez, Berio, Stockhausen, Xenakis, entre outros. 

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Da matriz corbusiana na arquitetura brasileira

O trecho a seguir trata da inserção de Le Corbusier entre os primeiros modernos europeus. Nesse contexto, fica clara sua distância da questão social na arquitetura – tema caro aos modernistas alemães, especialmente Walter Gropius e Ernst May. No que tange a habitação de interesse social, Le Corbusier se distancia ainda mais do modernismo de matriz socialista, ao conceber o problema da demanda habitacional européia como um desafio técnico da produção em escala industrial – não como parte da lógica especulativa imobiliária dos lotes urbanos e da regulação dos preços de venda e de aluguel a partir de uma alta demanda por habitação.

O segundo trecho denota como a opção pela matriz arquitetônica corbusiana se relaciona diretamente com a aproximação de Lúcio Costa do Ministério de Gustavo Capanema, durante a Era Vargas. A partir dessa aliança, a arquitetura brasileiro, como propagada internacional, se tornaria sinônimo de “Escola Carioca” aos olhos do mundo nas décadas seguintes.

Excerto: “O primeiro CIAM ocorreu em 1928 no Castelo de La Sarraz, graças à amizade de Le Corbusier com a proprietária do Castelo. Nessa época, Le Corbusier tinha muito pouca experiência na construção habitacional e buscava propagar suas idéias. Entretanto, os participantes do evento eram profundamente diversos em vários aspectos e muitos só tinham em comum o fato de serem modernos. Esse primeiro congresso ecoaria pouco no campo arquitetônico europeu, desenvolvendo mais a sociabilidade entre os participantes do que suas idéias. Coetâneo ao CIAM era o XI Congresso da Federação Internacional para Habitação e Planejamento Urbano, em 1928 e 29. Esse evento, ocorrido no mesmo ano e com o mesmo tema do CIAM, era voltado para habitação de interesse social, mas aceitava amplamente todos profissionais da área, não apenas arquitetos modernos.
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Alegorismo medieval, arquitetura gótica e a Iconologia de Panofsky

Do Alegorismo Medieval:

“Como a Iconologia, o Alegorismo Medieval é um método tripartite de interpretação. Inicialmente aplicado à exegese bíblica, o então “alegorismo sagrado” posteriormente se torna “alegorismo universal”, ao ser aplicado a todas as obras do Criador. Como demonstraremos posteriormente, o Alegorismo Medieval é o principal elo genético entre a Iconologia, o método mais utilizado em história da arte, e o habitus, obra “mais apaixonadamente defendida por Panofsky”.

O Alegorismo apresenta três camadas de sentido, à semelhança da Iconologia: o primeiro, literal – ou histórico –, o segundo, moral ou – tropológico – e o último, místico – ou anagógico. Também são trinos seus postulados: primeiramente afirma que tudo é imagem; em seguida, afirma que todas as imagens contêm discursos análogos; e em seu último postulado afirma que todos os discursos têm o mesmo objetivo de expor a presença de Deus.
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Modernismo, socialismo e exílio: Alexander Altberg no Rio de Janeiro da Era Vargas (1930-1945)

Excerto:          “Após perderem boa parte de suas posses ao longo das crises do entreguerras, a família Altberg perde seu status econômico confortável, o que aproximou os pais do partido comunista, ao qual eram filiados. Isso tem um impacto bastante significativo nas memórias mais antigas de Altberg. Certamente, a mais marcante memória desse período é de quando sua mãe o leva ainda criança para assistir um dos últimos discursos públicos de Rosa Luxemburg em Berlim. Alexander lembrava-se bem de receber em casa o jornal comunista Rote Fahne (Bandeira Vermelha) e o jornal burguês Berliner Tageblatt (Diário Berlinense).  Quando estudante, Altberg ajudou a organizar uma célula do partido comunista no bairro de Wilmersdorf, em Berlim, e participou do Congresso Comunista de Leipzig (ALTBERG, 2008). Mesmo no Brasil, esse ideário comunista permaneceu em Altberg.

Em 1925, ainda com 17 anos, Altberg ingressou na Bauhaus Dessau. Lá cursou o Vorkurs, ou curso preliminar, que duraria cerca de um ano e introduziria o aluno aos fundamentos da arquitetura através da prática com materiais e estudos das formas, para depois partir para estudos especializados. Do período, Altberg relembrou a horizontalidade da relação entre o professor e o aluno, mas também se ressentia das dificuldades financeiras da escola e do experimentalismo que, apesar de construtivo, não garantia uma formação e um diploma em arquitetura:
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